São largas centenas, trouxeram o crioulo e outras sonoridades africanas para as ruas de Bragança, estão organizados em movimentos associativos e têm uma equipa de futebol que disputa o campeonato da Divisão de Honra da AF. Bragança. Vêm para estudar no IPB e se uns regressam aos seus países de origem, outros optam por ficar e instalar-se em Bragança.
São cerca de 700 os estudantes africanos residentes em Bragança, provenientes em grande parte dos PALOP – Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa. Vivem 11 meses por ano em Bragança, muitos ficam ao longo de vários anos e contribuem para a criação de riqueza na região. Depois de concluírem o seu percurso académico no Instituto Politécnico de Bragança (IPB), uns regressam aos seus países de origem, outros optam por permanecer em Bragança.
Edvaldo Fernandes, cabo-verdiano e presidente da Associação de Estudantes Africanos em Bragança (AEAB), está há quatro anos em Portugal a estudar Gestão Desportiva e há dois na presidência da Associação, cujo raio de acção são as cerca de sete centenas de estudantes africanos do IPB, na sua grande maioria, oriundos dos Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa (PALOP).
Este líder associativo, que é também o presidente da equipa de futebol dos Estudantes Africanos, diz que lhe agradou “o projecto da AEAB e a relação de proximidade com a cidade”. Com efeito, um dos motores da integração desta comunidade tem sido a equipa de futebol, composta, na sua maioria, por estudantes africanos e que tem dado cartas na Divisão de Honra da Associação de Futebol de Bragança. “A integração é excelente, muito maior do que eu esperava. Também temos a equipa de futebol, que acolhe muitos caloiros africanos, mas também portugueses, o que facilita a integração”.
Quanto ao diálogo com os responsáveis locais, “não temos qualquer tipo de queixa, quer do IPB, quer da câmara municipal, quer de outras instituições locais. Tem sido uma boa relação, em tudo o que precisamos eles estão aí para nós e ao contrário também é verdade. Sentimo-nos em casa”.
Edvaldo Fernandes quer continuar em Portugal e Bragança é uma das primeiras opções para prosseguir os estudos superiores e iniciar a sua vida profissional.
Óscar Monteiro, cabo-verdiano de 33 anos, é um dos pioneiros entre os estudantes africanos em Portugal e os 14 anos que já leva de Bragança dão-lhe uma perspectiva abrangente dos caminhos seguidos por esta comunidade. Destaca a relação a três – AEAB, CMB e IPB – e o diálogo constante entre as três instituições: “existe uma ligação muito forte e todos os processos são tratados directamente entre as instituições”, realça.
Óscar é um caso paradigmático de integração na comunidade brigantina. Já foi presidente da AEAB, é o actual treinador da equipa de futebol dos Estudantes Africanos e empresário na área da produção de eventos musicais.
Para o mister Óscar Monteiro “o melhor resultado desta equipa é fora de campo. Dentro de campo vamo-nos divertindo, mas o mais importante é o que se faz fora das quatro linhas, é o nome que a equipa dá à cidade, à comunidade africana. E é dos melhores exemplos de integração, o que mereceu destaque já a esse nível, quer em termos nacionais, quer em termos internacionais”.
Para este representante da comunidade africana em Bragança, “a equipa vale por causa da sua função integradora. A nossa equipa só é a equipa que é pela interligação que tem feito entre as duas comunidades”.
Quanto à empresa que criou há dez anos, a “young beats”, é ela própria um dínamo integrador, sobretudo, entre a comunidade africana: “tem duas vertentes, uma direccionada para a comunidade africana, outra, para a comunidade brigantina. O objectivo é quebrar as barreiras entre as duas comunidades”, apostando na educação dos mais novos : “direccionamos a nossa actividade para os jovens, pois é mais fácil reeducar os jovens a aceitar os outros, desde o início do seu crescimento e formação, do que os mais velhos, a quem é preciso dar mais tempo”.
Para este licenciado em Línguas e Relações Internacionais, actualmente estudante de mestrado na área de tradução, que se define como um “líder nato” e a viver em Bragança desde os 19 anos, regressar para já a Cabo Verde não está nos seus planos. Quer continuar em Bragança, dar continuidade à sua actividade profissional e prevê casar em breve com uma portuguesa, brigantina de gema. Para além das várias funções que já desempenha é actualmente colaborador nos serviços académicos do IPB na área das relações nacionais e internacionais: “é a minha área e gostaria de continuar por aqui”.
Uma das ideias pré feitas em relação aos estudantes oriundos dos PALOP é que vêm a Portugal formar-se e vão-se embora logo de seguida para integrar os quadros superiores dos seus países de origem. Se nuns casos é assim, noutros nem tanto. Óscar Monteiro fala de vários exemplos que se mantêm em Portugal depois de terminarem o seu percurso no ensino superior: “há uma comunidade de africanos, que já não são estudantes e que tem crescido bastante. Temos muitos casais que já tiveram filhos aqui e que pretendem viver cá, estando perfeitamente integrados”. Tanto Edvaldo Fernandes como Óscar Monteiro consideram errada a ideia de que a comunidade africana em Bragança vive ensimesmada, fala preferencialmente em crioulo e que não convive com a restante comunidade. Para o presidente da AEAB,” esta é a comunidade de estudantes africana mais compacta em Portugal”.
Regressar a Cabo Verde
Marlos Monteiro tem 26 anos e veio para Bragança na mesma altura que Edvaldo Fernandes. Está no último ano de Gestão Empresarial a que se seguem dois anos de mestrado e, logo depois, o regresso a Cabo Verde: “caso surja uma boa proposta de trabalho lá, por que não? Tenho interesse em ajudar o meu país a crescer, se o puder fazer em Cabo Verde tanto melhor”
Aos 28 anos, Rony Furtado fez um percurso diferente dos seus colegas. Estudou Contabilidade e Administração em Cabo Verde e só depois veio para Portugal para fazer mestrado na sua área, ao abrigo de uma parceria entre o IPB e o município do Tarrafal, na ilha de São Nicolau. “Não quis ficar apenas naquele ambiente universitário cabo-verdiano e por isso resolvi vir para cá”, trazido por amigos que já cá estavam e o ajudaram a fazer a sua opção por Bragança.
Rony termina o mestrado no final do presente ano lectivo e vislumbra também ele um regresso imediato à sua terra natal “porque tenho a noção de que posso contribuir de alguma forma. Cabo Verde tem um número de quadros bastante grande que, talvez pelo facto de o país ser pequeno e o mercado de trabalho reduzido, optam por trabalhar fora. Eu quero ajudar a inverter essa tendência”.
Marlos Monteiro tem uma opinião dissonante e considera que ainda há a tendência dos estudantes africanos se relacionarem preferencialmente entre si, “o que é um erro. Mas as coisas também se proporcionam assim. Há cursos no IPB em que 80 por cento dos alunos são africanos, o que dificulta a relação com as outras nacionalidades”. Para Marlos essa deve ser “uma das nossas preocupações e nós mesmos temos de tentar integrar-nos na comunidade portuguesa de Bragança e também com a comunidade de alunos Erasmus”, considerou.
Para Óscar Monteiro essa integração já é um sucesso, prova disso é o evento «I love Bragança», que decorreu em junho do ano passado “e que se realizou para comemorar a cidade de Bragança através dos estudantes estrangeiros. E também é de destacar o esforço que a cidade tem feito para incluir os estudantes estrangeiros rematou.
Publicado em: “Jornal Nordeste”